Nove anos depois de ser implementada, a Reforma Psiquiátrica brasileira ganhou novo fôlego após a realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial (IV CNSM-I), em Brasília. As propostas aprovadas pelos participantes reforçam o modelo de serviço aberto e humanizado, adotado pelo Ministério da Saúde, para atender pessoas com transtornos mentais. Ao todo, 1.235 sugestões foram analisadas por mais de mil pessoas, entre especialistas, pacientes e familiares. A votação terminou na madrugada desta sexta-feira (2).
A criação de grupos de ajuda mútua de doentes mentais foi uma das decisões de destaque. Inspirada em experiências internacionais bem-sucedidas, a proposta baseia-se em encontros de até 20 usuários do serviço de saúde mental para discutir sobre as adversidades do dia a dia e como enfrentá-las. Um projeto-piloto já foi desenvolvido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e contou com financiamento do Ministério da Saúde. Foram repassados, neste ano, R$ 181 mil para a UFRJ promover as reuniões e capacitar os próprios pacientes a atuar como líderes das discussões.
Ao integrar um grupo de apoio, a pessoa com transtorno mental começa a estabelecer vínculos e fortalece as amizades. “Esse suporte emocional rompe com o autoisolamento do paciente e contribui com a reabilitação dele. É um dos dispositivos mais eficazes no acompanhamento contínuo de casos graves”, avalia o coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Pedro Gabriel Delgado.
AVANÇOS – A IV CNSM-I também aprovou a expansão da rede de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Hoje, são 1.541 em todo o País – o equivalente a 0,63 para cada grupo de 100 mil habitantes. A cobertura é considerada boa, de acordo com parâmetros internacionais. Agora, a meta será ampliar a quantidade de CAPS III, que funcionam 24 horas para acolher, inclusive, usuários em crise.
Os CAPS garantem um atendimento comunitário a pessoas que sofrem de problemas como esquizofrenia e transtornos de ansiedade ou de adaptação. O tratamento, que envolve o convívio familiar e a socialização do paciente, vem substituindo gradualmente o modelo manicomial, que implica o isolamento característico dos hospitais psiquiátricos. Essa mudança foi determinada pela Lei 10.216, de 2001.
Por unanimidade, os delegados da conferência votaram a favor de uma proposta que impede a revisão dessa lei. “Todos [os participantes] rejeitam qualquer retrocesso que possa haver nas conquistas alcançadas pela Reforma Psiquiátrica. O nosso desafio é fortalecer a rede psicossocial e, para os casos de internação, aumentar os leitos psiquiátricos em hospitais gerais, que estão perto da comunidade”, sublinha o coordenador de Saúde Mental, Pedro Gabriel Delgado.
FORMAÇÃO – Uma das sugestões que deverão ser incluídas no relatório final conclusivo da IV CNSM-I é a de que recém-graduados em áreas relacionadas à saúde mental atuem na rede pública por um período pré-determinado. A proposta inclui brasileiros formados em instituições públicas e particulares. Eles poderão entrar em contato com os CAPS ou participar da atenção básica por meio das equipes da Estratégia Saúde da Família.
“A intenção é aumentar a presença de psiquiatras, psicólogos e demais profissionais do setor em áreas como a Amazônia, onde o acesso ao serviço de saúde mental ainda não é o ideal”, explica Delgado. A prestação desse tipo de serviço no Sistema Único de Saúde (SUS) precisa ser regulamentada em conjunto pelos ministérios da Saúde e Educação.
Todos os itens aprovados na conferência vão constar do relatório conclusivo do evento. Esse documento deve balizar as novas ações que passarão a integrar a Política Nacional de Saúde Mental.
Fonte: Agência Saúde